"A Verdade não precisa de defesa; por si mesma ela se defende. A Verdade precisa ser proclamada!"

27 dezembro 2011

"Um Feliz Natal!"

Por Pr. Luiz Carlos Tibúrcio



Você pode baixar o áudio da pregação para o seu computador ou dispositivo móvel em VOICE 005B.MP3

24 dezembro 2011

Dois velhos e um poeta













Por André Venâncio


Estamos chegando ao quinto Natal deste blog. Em três das quatro oportunidades anteriores, fiz posts propícios à ocasião; apenas em 2009 a data passou em branco. Este Natal ia entrar para essa segunda categoria, pelo simples motivo de que não me ocorrera nada de interessante para escrever. Mas, durante o culto dominical de que participamos no último dia 11, voltou à minha mente com força e clareza especialmente intensas uma reflexão já meio antiga, e percebi que chegara o momento de escrever a respeito.

O que aconteceu no referido culto é que foi lido o texto bíblico de Lucas 2.25-35, que na minha versão recebeu o título O cântico de Simeão. Trata-se de um trecho que sempre considerei particularmente belo e tocante. E, com isso, veio à minha memória um poema de T. S. Eliot inspirado nessa mesma passagem bíblica. Creio que a maioria dos meus leitores tem conhecimento da admiração que dedico a Eliot como poeta, dramaturgo, crítico literário e teórico da cultura. Inclusive, já dediquei um post a um de seus poemas em um Natal anterior, o de 2008. Não é, portanto, sem respeito que mantenho, ao mesmo tempo, desacordos quanto a certos aspectos de sua obra. O poema que mencionei tem algo que sempre me incomodou, mas que demorei para conseguir detectar e descrever com clareza. Esse longo processo se completou no último dia 11, e é em torno disso que pretendo construir minha mensagem de Natal deste ano.

O poema está transcrito abaixo; a tradução foi feita pelo célebre Ivan Junqueira, exceto em dois pontos nos quais, em minha opinião, ele cometeu equívocos que comprometem a integridade do texto lírico. Identifiquei esses pontos com asteriscos, e expliquei as razões de meu desacordo com Junqueira em notas apropriadas. Mas esse aspecto é apenas acessório. Antes de apresentar o próprio poema, transcrevo o trecho bíblico correspondente, pensando sobretudo nos leitores pouco familiarizados com as Escrituras. O poema de Eliot contém tantas alusões e paráfrases desse trecho (e também de alguns outros textos) que sua leitura ficaria consideravelmente empobrecida sem o conhecimento prévio do texto de Lucas. Logo depois da passagem bíblica, transcreverei o poema, e depois farei alguns comentários. A título de introdução, basta esclarecer que o episódio narrado se passou quando o Senhor Jesus ainda era bebê, e José e Maria o levaram ao templo de Jerusalém pela primeira vez. Foi ali que encontraram Simeão.

"Havia em Jerusalém um homem chamado Simeão; homem este justo e piedoso que esperava a consolação de Israel; e o Espírito Santo estava sobre ele. Revelara-lhe o Espírito Santo que não passaria pela morte antes de ver o Cristo do Senhor. Movido pelo Espírito, foi ao templo; e, quando os pais trouxeram o menino Jesus para fazerem com ele o que a lei ordenava, Simeão o tomou nos braços e louvou a Deus, dizendo: 'Agora, Senhor, podes despedir em paz o teu servo, segundo a tua palavra; porque os meus olhos já viram a tua salvação, a qual preparaste diante de todos os povos: luz para revelação aos gentios, e para glória do teu povo de Israel'. E estavam o pai e a mãe do menino admirados do que dele se dizia. Simeão os abençoou e disse a Maria, mãe do menino: 'Eis que este menino está destinado tanto para ruína quanto para levantamento de muitos em Israel e para ser alvo de contradição (também uma espada traspassará a tua própria alma), para que se manifestem os pensamentos de muitos corações'."

A Song for Simeon

Lord, the Roman hyacinths are blooming in bowls and
The winter sun creeps by the snow hills;
The stubborn season has made stand.
My life is light, waiting for the death wind,
Like a feather on the back of my hand.
Dust in sunlight and memory in corners
Wait for the wind that chills towards the dead land.

Grant us thy peace.
I have walked many years in this city,
Kept faith and fast, provided for the poor,
Have taken and given honour and ease.
There went never any rejected from my door.
Who shall remember my house, where shall live my children’s children
When the time of sorrow is come?
They will take to the goat’s path, and the fox’s home,
Fleeing from the foreign faces and the foreign swords.

Before the time of cords and scourges and lamentation
Grant us thy peace.
Before the stations of the mountain of desolation,
Before the certain hour of maternal sorrow,
Now at this birth season of decease,
Let the Infant, the still unspeaking and unspoken Word,
Grant Israel’s consolation
To one who has eighty years and no to-morrow.

According to thy word.
They shall praise Thee and suffer in every generation
With glory and derision,
Light upon light, mounting the saints’ stair.
Not for me the martyrdom, the ecstasy of thought and prayer,
Not for me the ultimate vision.

Grant me thy peace.
(And a sword shall pierce thy heart,
Thine also).
I am tired with my own life and the lives of those after me,
I am dying in my own death and the deaths of those after me.
Let thy servant depart,
Having seen thy salvation.


Um cântico para Simeão

Senhor, os jacintos romanos estão florindo nos vasos
e o sol do inverno resvala sobre as colinas de neve.
Rendeu-se a quadra obstinada.
Minha vida é leve, à espera do sopro da morte,*
tal uma pluma no dorso de minha mão.
A poeira entre os raios de sol e a memória nos cantos
aguardam o vento que esfria rumo à terra morta.

Concede-nos tua paz.
Muitos anos caminhei nesta cidade,
guardei fé e jejum, poupei para os pobres,
dei e recebi honra e conforto.
Ninguém jamais repeli de minha porta.
Quem se recordará de minha casa, onde viverão os filhos de meus filhos
quando vier o tempo do infortúnio?
Buscarão eles a trilha da cabra e a toca da raposa,
esquivando-se às faces e às espadas forasteiras.

Antes do tempo das cordas e dos flagelos e dos lamentos
concede-nos tua paz.
Antes das estações na montanha da desolação,
antes da hora certa da aflição materna,
agora, nesta quadra em que a morte se avizinha,
possa o Infante, o Verbo que ainda não falou nem foi falado,**
conceder a consolação de Israel
a quem tem oitenta anos e nenhum amanhã.

Conforme tua palavra.
Eles Te haverão de exaltar e de sofrer em cada geração
com glória e escárnio,
luz sobre luz, galgando a escada dos santos.
Não para mim o martírio, o êxtase do pensamento e da prece,
não para mim a última visão.

Concede-me tua paz.
(E uma espada trespassará teu coração,
o teu também.)
Estou cansado de minha vida e da vida dos que virão depois de mim,
estou morrendo de minha morte e da morte dos que virão depois de mim.
Deixa partir teu servo,
após ter visto tua salvação.

*: Junqueira traduziu o início desse verso como "minha vida é luz". Mas o restante do verso e o seguinte, ao comparar a vida a uma pena que cai ao menor sopro, mostra claramente que a intenção do poeta é aludir à leveza de sua vida. Aqui, portanto, "light" não é o substantivo "luz", e sim o adjetivo "leve".

**: O original diz "the still unspeaking and unspoken Word". "Unspoken"é algo que não foi falado, mas "unspeaking" é alguém que não fala. Como se vê, Eliot se vale do duplo sentido do termo "Verbo", que é aplicado a Cristo nas Escrituras: como Verbo, portador da revelação de Deus, ele ainda não foi revelado; e, como ser humano, é bebê e ainda não fala. Ao traduzir como "inexpresso e impronunciado", Junqueira introduziu no poema uma redundância empobrecedora, que perde de vista o duplo caráter do Verbo, pretendido pelo poeta.

Além da beleza e da profundidade, que evidenciam a genialidade do poeta, creio que a primeira coisa que chama a atenção no poema é que, se comparado à narrativa bíblica, ele contém uma porção de acréscimos: em sua oração, o Simeão de Eliot discorre sobre o jugo estrangeiro que pesava então sobre seu povo, antevê as horrendas consequências, para seus descendentes, da guerra contra o Império Romano que tomaria lugar sete décadas mais tarde (e talvez os infortúnios milenares do povo judeu em geral), e vislumbra também a superioridade do novo pacto sobre o antigo, do permanente sobre o provisório, do cristianismo sobre o judaísmo, do Evangelho sobre a Lei. É claro que não condeno de modo algum essa liberdade poética, inclusive porque o Simeão bíblico também tem, de um modo menos explícito, todas essas percepções. Apesar disso, esses conteúdos são parte do problema, de algum modo menos direto, e pretendo explicar por que penso assim. No poema, ao mesmo tempo em que há esse olhar voltado para o futuro, também está presente uma atenção contínua de Simeão sobre si mesmo enquanto ausente desse futuro. O ancião lamenta sua velhice, com a consequente impossibilidade tomar parte na nova dispensação, e declara-se cansado da existência incompleta na antiga, na qual, a despeito de sua vida piedosa, resta apenas a exaustão de quem prefere, diante das circunstâncias, o repouso da morte.

Contrasta nitidamente com esse espírito o do Simeão histórico. Em vez de ter dito "Deixa partir teu servo, após ter visto tua salvação", como o Simeão do poema, o que ele disse foi: "Agora, Senhor, podes despedir em paz o teu servo, segundo a tua palavra; porque os meus olhos já viram a tua salvação". A compactação poética deixou de lado pelo menos dois elementos deveras relevantes, que distorcem a mensagem em uma mesma direção. Primeiro, a submissão à manifesta vontade divina, "podes despedir [...], segundo a tua Palavra", se transformou em uma súplica quase desesperada: "Deixa partir". Nada no texto bíblico indica que Simeão estivesse insatisfeito com a vida. Mas, no poema de Eliot, nada indica que lhe restasse alguma satisfação. Isso me incomoda profundamente, e esse incômodo é reforçado pela segunda omissão: o Simeão bíblico diz "podes despedir em paz o teu servo". Não há essa paz no poema, a não ser como uma coisa três vezes pedida, mas não alcançada, restando apenas uma autocomiseração incompatível com a alegria de ser um servo daquele Senhor.

Alegria, eis a palavra-chave. O texto bíblico nos diz que Simeão recebera de Deus a promessa de não morrer sem contemplar o Messias com seus próprios olhos. Não nos é dito quanto tempo ele aguardou o cumprimento dessa promessa, se um único dia ou uma vida inteira. Mas ele "esperava a consolação de Israel" e sabia como ela viria; podemos estar certos de que contemplar o Cristo do Senhor era seu maior anseio. Quando, enfim, essa expectativa é satisfeita, não o vemos perdido em lamúrias ou divagações de qualquer espécie; muito ao contrário, a passagem nos diz que "Simeão o tomou nos braços e louvou a Deus". O texto bíblico transmite alegria intensa, empolgação incontida, louvor esparramado, lágrimas de gratidão escorrendo profusamente pelas faces enrugadas e descendo até uma barba grisalha. Aquele momento foi, sem dúvida, o ponto mais alto da vida desse justo.

Simeão não é mencionado em nenhuma outra parte das Escrituras, mas, nesse breve registro, Deus nos deixou um modelo de piedade, esperança, gratidão e senso de prioridade. Um exemplo de como Cristo deve e quer ser recebido. Não sejamos como o Simeão de Eliot, que, tendo Cristo em seus braços, distraiu-se miseravelmente em exaltar o passado, lamentar o presente e temer o futuro, perdendo-se em considerações sobre si mesmo, sobre os outros, sobre política - enfim, sobre tudo, menos sobre a Pessoa divina em cuja presença estava, e que deveria ocupar o centro de sua atenção, bem como de sua vida. Sejamos, ao contrário, como o Simeão histórico, o de Lucas, o das Escrituras, recebendo Cristo com a alegria que ele merece e dando-lhe, em nosso coração e em nossa vida, o lugar que é dele por direito. Que possamos aprender, cada vez mais, a tomar o menino Jesus nos braços com a devida reverência, e a depositar aos pés do Jesus crescido, humilhado e exaltado, todos os temores, frustrações e inquietações de que ele prometeu nos aliviar. O velho Simeão teve, nesta vida, uma única oportunidade de estar com Cristo, e aproveitou-a muito bem. Que não desperdicemos nossas oportunidades, que não sabemos quantas serão. Que, neste Natal, ao comparecer à presença de Cristo e olhar para ele, o vejamos como ele é, e nada menos que isso.

Feliz Natal a todos!


NOTA: A foto acima não pertence à postagem original

19 dezembro 2011

Dizem amar Jesus




Por Eric N. de Souza

Quando afirmamos que o mundo, ou seja, os não cristãos, odeiam o cristianismo, as leis de Deus e o próprio Cristo, as pessoas sentem-se assustadas com as afirmações e logo retrucam: você está errado! Não é assim. E como não dispõem de argumentações coerentes, não falam mais nada, somente negam a afirmação feita e dizem amar Jesus. Pensam que estão sendo coerentes, mas mostraremos que não.

Vamos pensar que realmente tais pessoas amam Jesus, mas como este amor é manifestado? Conhecem o Jesus que dizem que amam? Para eles Jesus realmente existiu ou fala-se tanto dele que o aceitam para satisfazer a opinião pública, digo sociedade? Notamos que vagamente estas pessoas mostram algo realmente coerente para que elas possam afirmar como dantes seu amor por alguém que pouco ou nada conhecem.

“O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento.” (Os 4:6a)

Então, falamos da revelação de Deus na Escritura, e aí é que tudo complica, pois em seguida vém os questionamentos: “não é bem assim. Foram homens que escreveram no passado num tempo diferente. Foram homens, não Deus”. Embora elas acertem que foram homens que escreveram, erram ao desconsiderar a inspiração divina guiando os homens nos relatos escriturísticos. Embora acertem que a Bíblia fora escrita no passado, erram ao desconsiderar que as Escrituras não possuem validade, correspondendo ao passado, presente e futuro, a Palavra de Deus, simplesmente permanece. Embora acertem o tempo diferente referindo-se ao contexto em questão, erram ao desconsiderar a Palavra absoluta de Deus, a verdade máxima, inegável e irreversível que não muda com as diversas gerações e contextos – somente é substituída ou satisfeita naquilo que a própria Palavra indica (sacrifícios, festas sazonais, etc).

“mas a palavra do Senhor permanece para sempre. E esta é a palavra que vos foi evangelizada.” (1 Pe 1.25)

Portanto, aquelas pessoas que ora afirmavam sua certeza em amar Jesus e não ser contra o cristianismo, descartam a validade e a veracidade do livro que revela o caráter e a vida daquele que era o seu amado. Pergunto: Como ratificar que se ama algo ou alguém tendo dúvidas ou até mesmo convicção que o livro que revela tais instruções e informações para respaldar sua certeza é duvidoso? Ou seja, eles consideram incerta a fonte de seu conhecimento na qual obtém dados da pessoa amada e das questões morais e mesmo assim, o amam e dizem acreditar no cristianismo? Não existe coerência. Para afirmar algo é preciso ter certeza da veracidade da fonte em que este algo é conhecido ou pressupor sua auto autenticação.

"As tuas palavras são em tudo verdade desde o princípio, e cada um dos teus justos juízos dura para sempre" (Sl 119.160)

09 dezembro 2011

A culpa é do pai [Crônica de uma viagem insólita]



Por Fábio Ribas

Já estávamos há 200 quilômetros da nossa cidade de origem, quando o inusitado aconteceu. “Pai, o senhor quer um chiclete?”, perguntou Ana Lissa. Prontamente, respondi que sim. “Mãe, então me dá dinheiro”, disse Ana para a Lu. Lu se aproximou do carro, espiou pela janela e disse assustada: “Meu Deus!!!”. Todos olhamos para ela perplexos: “O que foi?”. Ela levantou um olhar de descrença, abriu a porta, mexeu debaixo do banco do carro, olhou atrás... “O que foi, Lu?”, perguntei sem saber o que a estaria exasperando. Ela olhou nos meus olhos com olhos bem arregalados e confessou a tragédia: “A bolsa! A minha bolsa! Esqueci a minha bolsa!”.

Na bolsa da Lu, além do óbvio como maquiagem, espelho e uma nécessaire, havia também o cartão de crédito, dinheiro, nossos documentos de identidade, CPF, etc. A descoberta da ausência se deu porque Aninha quis mascar chiclete. Mas é claro que minha esposa não sofre de alguma deficiência que a impossibilite de lembrar de coisas tão essenciais. A culpa não foi da mãe. A culpa foi do pai. Vou contar. Três horas antes da descoberta da ausência da bolsa, fomos pegar nossas filhas que tinham ido dormir na casa de uma amiguinha. Estava tudo combinado, então bem cedo passaríamos para pegá-las e tomaríamos o rumo de Brasília. Assim, hoje de manhã, parei o carro na frente da casa onde estavam minhas filhas. 

- Amor, fecha o carro.
- Para quê, Lu. A gente vai rapidinho. Não vou fechar não.
- Então, eu vou pegar a bolsa para que ela não fique aí.
- Menina, a gente vai rapidinho, ninguém vai passar aqui e roubar o carro há uma hora dessa da manhã.


Mesmo assim, a Lu voltou no carro e pegou a bolsa. O resto da história já dá para imaginar: as mãos cheias de malas e sacolas e outras bugigangas infantis. E a bolsa? Coloca em cima da mesa, depois pega. Assim, por causa de mim, três horas depois, estávamos nós retornando à casa da amiguinha das meninas para pegar a bolsa da Lu. Mas você acha que a nossa viagem se encerrou só por causa disso?! Uma bolsa esquecida? Nada. Vínhamos animados e cheios de planos. Pegaríamos a bolsa e retornaríamos felicíssimos ao rumo de Brasília. Enquanto enchíamos nossas conversas com esses sonhos de viagem e quase chegando na casa onde se encontrava a bolsa: PUM!!! Um terrível barulho se fez. Segurei firme o volante, enquanto tentava entender o que estava acontecendo. O pneu da frente, que ficava do lado esquerdo, acabava de estourar. Como? Só Deus sabe. Paramos e trocamos o pneu. Mas a borracha do pneu (o pneu estava irreconhecível) havia voado na direção do meu retrovisor lateral e, creiam, o retrovisor foi arrancado do carro. Agora, estávamos sem bolsa, sem pneu e sem retrovisor.

A bolsa foi pega logo que entramos na cidade, o estepe deu lugar a um pneu novo (o que nos obrigou a comprar outro novo “por causa do alinhamento do carro”, convenceu-nos o vendedor de pneus), agora, o retrovisor só foi possível depois do almoço, uma vez que a hora avançara e minha cidade fecha o comércio de meio-dia até 13:30. É a siesta.

Estava tarde para tomarmos o rumo de Brasília? Sim, deixamos para o dia seguinte nossa saída. Mas, infelizmente, houve uma nota trágica no desenrolar dessa nossa história. Quando chegamos aqui em casa, minhas filhas vieram em minha direção com as mãos na cabeça e os olhos cheios de lágrima e indignação: “Pai! Pai! Ela morreu! A Tica morreu!”. Neste momento, juro que não acreditei em mais esse item dessa lista tão cheia de ocorrências inesperadas. “Pai! Ela está sem a cabeça! Só o corpo dela está lá. Ela está sem a cabeça!”, diziam minhas filhinhas com os olhos cheios de lágrimas.

Gisele e seus coelhinhos

Tica era um dos setes coelhinhos nascidos recentemente aqui no terreno da nossa casa. O gato a matou nesta noite. “Pai, você disse que a Tica era rapidinha e que o gato não ia alcançá-la!”, disse-me Gisele, cortando meu coração. Mais uma vez, a culpa foi do pai. Sim, acho que me deixei levar pela minha ingenuidade urbana – nunca imaginei que o gato iria conseguir alcançar aqueles coelhinhos tão serelepes e agitados. Depois disso, a minha primeira providência foi arranjar um jeito de salvar os demais coelhinhos do gato tirano. 

Estamos todos bem agora, descansados e curtindo a ideia de amanhã vermos o vovô e as vovós (se Deus quiser!). Entretanto, devo confessar que não me sai da cabeça a incrível ideia de que nossa viagem fracassou hoje não por causa da bolsa, do pneu ou do retrovisor, mas porque tínhamos que voltar para salvar a vida dos outros pequeninos lindos seis coelhinhos das minhas filhas.

FONTE: CASAL 20

03 dezembro 2011

Os vasos não fazem a si mesmos...











Por Natan de Oliveira

Mas ó homem, quem és tu, que a Deus replicas?" Romanos 9.20

Geralmente a visão de uma criança e de um bebê, principalmente se bonito, é uma linda figura que desperta na mente humana um sentimento de intocabilidade e inocência.

Baseado nesta falsa aparência a filosofia em geral concluiu que o homem nasce bonzinho e que as crianças são inocentes.

Não é isto que a Bíblia ensina.
A Palavra de Deus diz que o homem nasce pecador.

"Sei que sou pecador desde que nasci, sim, desde que me concebeu minha mãe." Salmo 51.5

Após o nascimento já temos um pecador no mundo, que de fato ainda não pecou, mas sua natureza está toda ali potencialmente disponível para ser o que é.

Deixe crescer e o menino manifestará a sua natureza da forma mais "natural" possível, pecando.

E a Escritura vai além, nos revela que antes mesmo do nascimento, já éramos pecadores miseráveis.

"Os ímpios erram o caminho desde o ventre; desviam-se os mentirosos desde que nascem." Salmo 58.3

Esta malignidade se manifesta em rebeldia, desde pequeno, primeiramente em pequenas doses, depois em maiores rompantes.

Para conter sua rebeldia, os pais da criança o corrigem com disciplina, educação e chineladas apropriadas.

"A insensatez está ligada ao coração da criança, mas a vara da correção a afugentará dela." Provérbios 22.15

Os pais que se deixam iludir pela suposta aparência de almas inocentes e não corrigem seus filhos, acabam gerando para a sociedade, rebeldes insuportáveis, mimados e sem limites que serão fonte de angústia para os pais quando adultos e em muitos casos um peso social também.

"A vara e a repreensão dão sabedoria, mas a criança entregue a si mesma, envergonha a sua mãe." Provérbios 29.15

Sua disposição para pecar (fazer aquilo que desagrada a Deus, ou fazer aquilo que Deus não permite que se faça) e sua rebeldia natural contra as leis de Deus cresce à medida que a criança cresce.

No coração de um homem rebelde, o conhecimento da lei de Deus lhe produz reação contrária, expressa sempre em andar segundo o desejo da sua própria vontade.

"Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também." Efésios 2.3

Entram em conflito dois adversários ferrenhos, de um lado a vontade do homem na procura de deleites, do outro lado a vontade Deus.

Esta luta perdurará sem grandes mudanças até o novo nascimento em muitos, ou então até a rebeldia total e perdição nos demais.

Os que persistem em ser rebeldes, mas são letrados na filosofia e ciência, quando descobrem que Deus se revela soberano na Escritura, chegam a desafiar a Deus em suas mentes com perguntas tipo:

"Por que você (Deus) se queixa ainda? Porventura, quem tem resistido à Sua vontade? Afinal se eu sou rebelde Ele (Deus) me fez assim..." Paráfrase de Romanos 9.19

Deus então responde prontamente: "Mas ó homem Rebelde, quem és tu, que a Mim replicas?" Romanos 9.20

E Deus ainda continua dizendo, "Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim?" Romanos 9.20b

Todo homem dará conta do que pensou, fez, ou deixou de fazer diante do Criador e Este tem poder para fazer vasos como achar que devem ser feitos.

"Ou não tem o oleiro (Deus) poder sobre o barro (a terra), para da mesma massa (terra) fazer um vaso para honra (eleitos) e outro para desonra (reprovados)?" Romanos 9.21

E ainda...

"E que direis se Deus, querendo mostrar a sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para a perdição..." Romanos 9.22

E ainda mais...

"Para que também desse a conhecer as riquezas da sua glória nos vasos de misericórdia, que para glória já dantes preparou...?" Romanos 9.23

Lição profunda para a qual os chamados pelo Senhor se mostram gratos e maravilhados.

Lição intrigante para a qual, os que persistem em continuar rebeldes contra o Senhor, se mostram ainda mais incomodados, endurecidos e irados.

O Evangelho provoca alegria e ira ao mesmo tempo, dependendo do coração para quem ele é proclamado.

Não seja o teu coração endurecido em ira e rebeldia.

Ouça o Evangelho, vá em velórios, acompanhe o cortejo até o cemitério, fique até o fim, observe com atenção o que lá ocorre, saiba que o que é pó se tornará novamente pó...

"Os passos do homem são dirigidos pelo Senhor; como pois, entenderá o homem o seu caminho?" Provérbios 20.24

Para evitar tais verdades e textos bíblicos, o homem inventou um outro evangelho, o cristianismo humanista, para o qual Deus é somente um tipo de “Marshmalow de Amor”.

E este outro evangelho se tornou um sucesso... Todavia a própria Escritura revela que tais doutrinas são doutrinas de demônios e que Satanás é seu mentor maior.

Que outro evangelho é este, alguém me perguntaria? 
A própria Escritura dá a resposta:

“Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema.” Gálatas 1.8-9

Que outro evangelho é este, alguém teimaria em perguntar?
É todo aquele que prega loucamente que os vasos fazem a si mesmos...

27 novembro 2011

Por que, eventualmente, acredito no Papa Bento XVI?




Por Fábio Ribas


Penúltimo artigo desta nossa série em que estamos comemorando o aniversário de 1 ano do nosso blog pró-família, publicando artigos escritos por nós e que foram muito importantes na nossa formação, porque foram textos escritos na ebulição de ideias que nos apaixonam. 

Abraços sempre afetuosos. Casal 20.
____________________________________________

Quantas vezes entrávamos na capela dos orionitas para nos curvar diante da presença do sagrado naquele lugar? Mas não naquela manhã de outubro. Estávamos ali há quase 10 horas e, à medida que se arrastavam os minutos, estes iam diluindo o sagrado que eu julgava haver ali. Por fim, alguém trouxe o rádio que usávamos em nossas devocionais e o colocou ali para tocar "a mais bonita das noites" de Chitãozinho e Xororó, sucesso nacional daquela época. 

Chegou a minha vez de subir com os padres. Todas as portas dos armários dos meus colegas de quarto estavam abertas e todas as roupas e pertences deles jogados bem no meio do quarto. Pegaram meus livros, cadernos e roupas e os jogaram junto às outras coisas que já estavam no chão. Eles estavam procurando alguma coisa, eu sei. A secretaria do seminário havia sido roubada e certamente um de nós seria o ladrão. Estavam procurando pelo dinheiro… Não! Soubemos depois que eles já sabiam qual seminarista havia roubado o dinheiro, mas eles aproveitaram a oportunidade para nos devassar, descobrir sujeiras, fotos, revistas, outras possíveis perversidades juvenis que poderíamos esconder deles. Voltei à capela. Abaixei a cabeça. Fechei os olhos… o sagrado morria para mim naquele dia.

Depois daquela experiência da morte do sagrado, muitos foram embora do Seminário. Eu ainda tentei insistir num outro ano, mas o rasgo havia sido feito: a experiência do sagrado já era morta. E se pudesse tentar explicar o que considero a mais importante diferença entre Barth e Tillich diria que este avançou sobre essa ideia da experiência do Sagrado Universal como revelação salvífica, enquanto Barth permaneceu compreendendo que o Cristianismo é o único detentor da revelação especial. Para Tillich, o caminho natural das religiões mostrava nelas a revelação salvífica de Deus, enquanto para Barth existia a cisão entre a verdadeira religião e as falsas religiões, ou melhor, entre revelação e religião. Todas as religiões possuem a experiência do sagrado (Tillich, Rahner, etc), mas somente no Cristianismo é possível a experiência da fé (Barth). Assim, naquele dia na capela, o que morria em mim era a experiência do sagrado, já que ainda não conhecia a experiência da fé.

Ao ler a reportagem da Revista Ultimato, cujo título é “A coragem de dizer aos que querem mudanças na igreja que eles, eventualmente, têm razão”, percebi por que Bento XVI (colega de Karl Barth na juventude) continua a achar que homens como Pedro Casaldáglia, Hans Küng e Frei Betto não têm razão. Estes compactuam tão somente do pluralismo da experiência do sagrado e não da experiência da fé revelacional e salvífica em Cristo Jesus. Eles fazem do Cristianismo apenas um espaço para a manifestação dos deuses de seus ventres. É claro que Bento XVI nunca achará que eles têm razão. É evidente também que acusarão Bento XVI de retrógrado. A discussão sobre o casamento dos padres é fachada para esses homens. O assunto do fim do celibato é apenas uma desculpa de apelo populista, porque o que eles querem mesmo é o nivelamento do cristianismo com todas as demais religiões. O que resultará numa grande apoteose de um panenteísmo universal (Tillich, Boff).



Pedro Casaldáliga é a favor das invasões de terra e da luta armada, compôs poema para elogiar Che Guevara, um terrorista e comunista. Bento XVI não vai ser contraditório com Pio XI. Este condenou o comunismo (Divini Redemptoris) dizendo que o sistema marxista era "intrinsecamente mau". Este mesmo Papa declarou ainda que ninguém poderia ser verdadeiro católico e verdadeiro socialista.

Frei Betto participa do mesmo ambiente de Pedro Casaldáliga e se coloca como amigo de Fidel Castro, o ditador cubano. Em seu texto “Raízes éticas da minha esperança”, Frei Betto confessa a quem ainda tenha dúvidas de suas aspirações: “Experimentei muitas derrotas: a morte de Che na Bolívia, o fracasso dos grupos armados contra a ditadura militar brasileira, o terror da Revolução Cultural chinesa, a falência da Revolução Sandinista, acrescida de casos escabrosos de corrupção, a queda do Muro de Berlim, o fim do eurocomunismo”. 

Hans Küng, outro personagem controverso citado na reportagem da Ultimato, é um teólogo liberal que não crê na ressurreição literal de Jesus. Bem, como o comunismo também não crê, é louvável pensar que nem Frei Betto e nem Casaldáliga creiam também, se juntando ao também já declarado descrente Leonardo Boff.

Por tudo isso, digo mais uma vez que homens como esses não estão interessados que padres casem ou não. Não estão interessados em questões como paz, amor, fraternidade, embora estas palavras abundem em seus textos. Eles tão somente erguem essas bandeiras por crerem que elas terão um apelo mais popular. O que está por trás deles é o fim do cristianismo bíblico e da salvação somente em Jesus. Karl Barth percebe este desenvolvimento da Teologia Natural nas teologias modernas e pós-modernas e reage teologicamente: “a possibilidade do conhecimento de Deus encontra-se na Palavra de Deus e em nenhum outro lugar” e “o Deus eterno deve ser conhecido em Jesus Cristo e não em outro lugar.” Tillich cria que haveria revelação salvífica em outras religiões. Barth não. Frei Betto já expressou sua fé no socialismo. Bento XVI não. 



Assim, quando se juntam pessoas de interesses tão diversos (e excludentes) debaixo de um único guarda-chuva: descrentes comunistas, descrentes liberais, padres que querem casar, Reformadores do século 16, Concílio Vaticano II e até Simonton, o missionário presbiteriano que trouxe sua Denominação ao Brasil, acaba-se por nivelar por baixo causas nobres juntamente com aquelas causas escusas. Sem falar que colocar Frei Betto, Casaldáliga e Hans Küng ao lado dos Reformadores do Século 16 e de Simonton é dar aqueles uma envergadura teológica e moral que jamais tiveram. Finalmente, desenha-se uma caricatura de Bento XVI e o coloca isolado de um lado, enquanto do outro estariam “os heróis da resistência”. Mas isto não é cristianismo, é maniqueísmo. E apresentar ao leitor estas controvérsias de modo tão parcial é ruinoso para a Cristandade. É isto o que faz a reportagem da Revista evangélica Ultimato, uma revista fundada por um pastor presbiteriano. É neste contexto, portanto, que afirmo que, certamente, Bento XVI tem discernimento e coragem de dizer NÃO às verdadeiras intenções dos seus inquisidores que o acusam de reacionário.

Título original deste post: 

"A coragem de Bento XVI em dizer... ... eventualmente, não!" 

FONTE: "Casal 20" e "Mulheres Sábias... Blog da Rô"

19 novembro 2011

Responsabilidade e Liberdade














Por Natan de Oliveira

“Então disse ele: Vai, e dize a este povo: Ouvis, de fato, e não entendeis, e vedes, em verdade, mas não percebeis.” Isaías 6.9

----

De madrugada o menino Pedro acordou, tirou a jarra de suco da geladeira, encheu um copo, bebeu.

Sonolento, voltou a dormir e esqueceu a jarra de suco sobre a mesa da cozinha.

Pela manhã seu pai pergunta:
- Quem foi o responsável por este fato?

Ou talvez tenha perguntado assim:
- Quem que deixou a jarra de suco sobre a mesa?

Pedro não é considerado responsável pelo ato, devido ao fato de ele ter tido a liberdade de deixar a jarra ou não na mesa, mas ele é responsável, pois o fato se remete a ele, afinal foi ele quem deixou a jarra na mesa.

A responsabilidade se estabelece não por causa da liberdade de escolha que ele teve em guardar a jarra ou não.

A responsabilidade se caracteriza devido à ação do Pedro, e por isto ele é o responsável.

Mesmo tendo sido negligente (estava sonolento) em não guardar a jarra, mesmo assim é responsável pelo fato de a mesma não ter sido guardada.

----

Este pequeno exemplo, procura explicar em palavras simples como que responsabilidade moral pode não estar associada à liberdade autônoma de escolha.

Somos responsáveis pelo pecado, e também somos responsáveis pelo correto agir, não porque temos liberdade de escolha entre as duas opções, mas simplesmente porque o pecado cometido foi feito por nós.

O Senhor perguntará:
- Quem foi o responsável por este pecado?

Ou talvez assim:
- Quem fez o pecado tal?

A pessoa que cometeu o delito, esta é a responsável.
Ele não vai perguntar se pecamos livremente ou não, mas sim se fizemos.

“Digo-vos que de toda palavra frívola que proferirem os homens, dela darão conta no Dia do Juízo.“ Mateus 12.36

O problema é que a Bíblia declara que algumas coisas são pecados e outras não.
E mais, explica que o salário do pecado é a morte.

“Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor.” Romanos 6.23

Deus facilmente poderia ter decretado diferente.
Friamente falando, a relação sexual entre marido e mulher é diferente entre a relação sexual entre solteiros?

Por que Deus disse que entre marido e mulher não é pecado e por que disse que a outra relação é adultério ou fornicação e abominação, se na essência elas são uma série de atos íntimos praticamente idênticos?

Por quê?
Ninguém sabe.
Deus desejou assim.

“Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu (Jesus), porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela.” Mateus 5.27-28

Decidiu também punir os pecadores.
Desejou salvar muitos deles.

“Que diremos, pois, se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição, a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão, os quais somos nós, a quem também chamou, não só dentre os judeus, mas também dentre os gentios?” Romanos 9.22-24

A responsabilidade do pecado dos reprovados será punida por Deus.

A responsabilidade do pecado dos eleitos (aqueles que crerem no Evangelho) foi assumida por Deus na cruz através de Jesus Cristo, e a estes não será imputada punição, pois já foi aplicada em Cristo.

“Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica.” Romanos 8.33

Assim, num cenário de predestinação absoluta, que a meu ver, é o que a Bíblia ensina, mesmo que o homem não tenha livre-arbítrio, mesmo assim ele é responsável por todos os seus atos.

"Quem poderá falar e fazer acontecer, se o Senhor não o tiver decretado? Não é da boca do Altíssimo que vêm tanto as desgraças como as bençãos? Lamentações 3. 37-38

Acho que ainda não consegui explicar como que responsabilidade não tem nenhuma ligação com liberdade de escolha... 

Afinal o humanismo colocou na cabeça das pessoas que o homem só poderia ser responsável por alguma escolha, se ele fosse livre para fazê-la. 

Para estes a predestinação retira a responsabilidade do homem.

Todavia vou continuar tentando achar formas simples de explicar tal assunto, que entendo ser o correto ensinamento da Escritura (O determinismo bíblico), mas que a minha mente ainda não dá conta de imaginar analogias simples que possam explicar.

Humanisticamente falando, algumas pessoas (o louco, por exemplo) são inimputáveis diante do Direito Penal, ou seja, um louco mata alguém, ele não sabe o que está fazendo, então não será punido... Mas mesmo sem ser punido ele ainda é o responsável, pois foi ele, o louco, quem matou.

Biblicamente falando, algumas pessoas (os eleitos) são inimputáveis diante do Julgamento Final, ou seja, estes eleitos também pecaram e são pecadores miseráveis, mas não serão condenados apenas pelo fato de que o próprio Deus pagou na cruz pelos seus pecados... Mas mesmo sem serem punidos, eles ainda são os responsáveis pelos seus pecados, pois foram eles que o fizeram.

“Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.” Isaías 53.5

Assim Deus, mesmo sendo soberano e tendo decretado todas as coisas antes da fundação do mundo, não é o responsável pelo pecado de ninguém, pois não é Ele quem peca.

Mas Deus é o pagador, o resgatador, aquele que por muitos diz: Por este Eu paguei com o meu próprio sangue, este Eu não punirei, não porque ele não mereça punição, ele merece, mas porque a sua punição já foi paga por Mim.

“Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo.” 1 Pedro 1.18-19

Uma vez pago, podemos até falar em responsabilidade, mas não se pode mais falar em punição ou novo pagamento.

Está consumado!
Está pago!

“E (Jesus) disse: Está consumado. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito.” João 19.30

Mesmo não tendo liberdade de escolha, mesmo sem livre-arbítrio, mesmo assim sou responsável por todos os meus atos.

Nas escrituras sagradas nós temos arbítrio, temos escolha, mas note que ela não é livre, não é um livre-arbítrio, nem mesmo uma livre-escolha, porque ou somos escravos do Pecado ou somos escravos de Deus.

Diante da escolha abaixo, qual será o caminho que um pecador escravo do pecado irá tomar?
“Eis que, hoje, eu ponho diante de vós a bênção e a maldição...” Deuteronômio 11.26

Pode parecer diante do texto acima, que o pecador tem livre-arbítrio, todavia perceba que é apenas arbítrio, pois se você ainda é escravo do pecado, não irá de forma alguma escolher a vida (a benção).

“Porque a inclinação da carne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz” Romanos 8.6

Até mesmo para que o pecador possa escolher a vida, Deus precisa antes, vivificar o coração do pecador para que ele então tenha condições de fazer a escolha correta.

Aproxime-se de Deus.
Leia a Escritura, afinal como é que você vai saber se é escravo do pecado, se nem mesmo sabe o que é pecado ou não?
Nem mesmo sabe o que a Lei de Deus permite e o que proíbe? 

“Escondi a Tua Palavra no meu coração, para não pecar contra ti.” Salmos 119.11

Se você chegou até aqui, parece que você tem fome em saber sobre a Verdade (Jesus Cristo).

É isto pode ser um sinal de que a salvação também pode ser sua... Será?
Quem é que sabe?
Tomara que sim.

Se você verdadeiramente crer na mensagem do Evangelho, isto será uma cristalina evidência que a salvação chegou sobrenaturalmente no seu coração, e neste caso, ainda és RESPONSÁVEL por todos os miseráveis e indizíveis pecados que você cometeu, mas a boa nova é que Jesus Cristo já levou sobre si cada um deles, que você está perdoado, e que agora é LIVRE para não mais pecar.

“Mais tarde, Jesus o encontrou no templo e lhe disse: Olha que já estás curado; não peques mais, para que não te suceda coisa pior.” João 5.14

13 novembro 2011

A autoria do mal, na visão Calvinista













Por Ricardo Castro


Sicut scriptum est... 

Quem é diretamente responsável pelas más obras?

Quando se põe a serviço do Diabo, o homem é levado pelo que agrada ao Diabo, e não pelo que lhe agrada?

Devemos atribuir algo a Deus quanto às más obras, nas quais a Escritura revela que seu poder age de algum modo?

As questões acima são relevantes e intrigantes.

Agostinho comparava a vontade do homem com um cavalo, que é governado pelo desejo daquele que o monta.

A vontade do homem natural está sujeita ao senhorio do diabo, sendo por ele conduzida, o que não significa que seja constrangida pela força e sem a sua aprovação, como se força um servo ou um escravo a fazer o seu trabalho, por mais que este o deteste. Sofrendo os abusos e as mentiras do diabo, é por necessidade, e não por constrangimento, que a vontade se sujeita a obedecer ao que o diabo quer. Isso é assim, porque aqueles que não recebem de Deus a graça de serem governados por seu Espírito, são abandonados e deixados com o diabo, para serem conduzidos por ele – 2Co 4.4. A cegueira de todos os praticantes do mal e todos os malefícios resultantes são declaradamente obras do diabo; e, todavia, não é preciso procurar a causa fora da vontade humana, da qual procede a raiz do mal e na qual está a base do reino do diabo, quer dizer, o pecado. Os incrédulos se encontram tão intoxicados pelo diabo, que, em seu estupor, não tem consciência da sua miséria. Assim, todos os que vivem segundo o curso do mundo, ou seja, segundo as inclinações da carne, batalham sob o comando do diabo – Ef 2.2.

Agora atentemos para o que ocorreu com Jó. Os caldeus causaram vários danos a Jó, matando os seus pastores e roubaram todos os seus camelos. E nós, quando vemos ladrões cometendo todo o tipo de roubos e mortes, não temos dúvida em lhes imputar culpa e de os condenar. Ora, assim é, e a história atesta que isso provém do diabo. Mas, Jó reconheceu que era obra de Deus, dizendo que Deus o tinha despojado dos bens que lhe tinham sido arrebatado pelos caldeus!

Como, então, poderemos dizer que uma mesma obra foi realizada por Deus, pelos homens e pelo diabo, e não desculparmos o diabo, sendo que parece agir em conjunto com Deus, ou, por que não dizer que Deus é o Autor do Mal? 

Para responder a questão acima, temos de considerar primeiro o fim e depois a maneira de agir. O propósito de Deus era responder a um questionamento do diabo e também, nos mostrar a paciência de Jó em meio à adversidade. Satanás esforçou-se para levar Jó ao desespero. Os caldeus se empenharam na empreitada de enriquecer-se roubando bens alheios. Temos então, bem definido as diferenças de propósitos, entre a obra de uns e outros. E vemos aqui uma verdade, dura verdade: “Os ladrões e os homicidas, e os demais malfeitores são instrumentos da divina providência, dos quais o próprio Senhor se utiliza para executar os juízos que determinou” - (Calvino). Assim, Satanás e os perversos salteadores foram os ministros, e Deus foi o autor.

“O que é Satanás senão o verdugo de Deus para punir a ingratidão humana?” – Calvino

O Senhor deixou o seu servo Jó com Satanás para que este o afligisse e, por outro lado, entregou-o aos caldeus, ordenando-lhes que agissem como seus ministros, e encarregou o diabo de os impulsionar e guiar. É evidente que Satanás está sujeito ao poder de Deus, e é de tal maneira governado por sua vontade, que se vê obrigado a obedecer-lhe e a cumprir o que lhe manda. Assim, ele, Satanás, que opera interiormente com seu poder compelidor, é ministro de Deus, de tal maneira que só age em obediência à ordem divina. Voltando ao caso que estamos considerando: Satanás estimulou com os seus aguilhões venenosos, o coração dos caldeus para cometerem aquela iniquidade e, estes, por sua vez, eram maus e, dando-se à prática daquela maldade, contaminaram o seu corpo e a sua alma.

Portanto, segundo Calvino, é próprio falar que a atividade de Satanás é reprovada, exercendo ele o seu reinado, isto é, o reinado da perversidade. Podemos muito bem dizer também que, de algum modo, Deus age quando Satanás, como instrumento de sua ira, segundo a sua vontade e as suas ordens, impele os homens para lá e para cá para executarem os seus juízos. Por tudo isso, vemos que não há incoerência em atribuir uma mesma obra a Deus e ao diabo, como também aos homens. Mas a diversidade, que está na intenção e no meio empregado, faz com que a justiça de Deus em tudo e por tudo se veja irrepreensível. A malícia do diabo e a do homem são reveladas pela confusão feita em ambos.

O que alguns apresentam no sentido de que Deus permite o mal, mas não o envia, não pode subsistir. Frenquentemente as Escrituras afirmam que Deus cega e endurece os maus, e que muda, dobra e move o coração deles. Não está certo empregar essas formas de falar recorrendo à presciência ou à permissão de Deus. O que vemos claramente é que o que existe é a Providência de Deus, e não outra coisa. Deus, para executar os seus juízos por meio do diabo, ministro da sua ira, dirige para onde bem lhe parece o conselhos dos maus, dá seguimento à vontade deles e confirma o seu esforço – Jó 12.20,24; 2Ts 2.11; Is 63.17; Ex 4.21; 7.3; 10.20; Ex 3.21; Dt 2.30; Sl 105.25.

“Enquanto por instrumentalidade dos ímpios, Deus leva a cabo o que decretou em seu juízo absconso, não são eles excusáveis, como se lhe estejam a obedecer ao preceito, que, deliberadamente, violam em sua desregrada cobiça.” – Calvino

Todas as vezes que aprouve a Deus castigar as transgressões de seu povo, não o fez por meio dos maus? Certo, nesses casos veja-se bem que o poder e a eficácia da ação procediam dele, e que aqueles maus eram apenas seus ministros. Por vezes ele ameaçou que com assobios chamaria nações para virem destruir Israel, por vezes os comparou com uma rede, e também como um martelo – Is 5 e 7; Ez 12.13; 17.20; Jr 51.20; Jr 50.

“No que os iníquos pecam, isso vem deles mesmos; e que, se ao pecarem fazem algo, isso vem do poder de Deus, que divide as trevas como bem lhe parece.” O ministério de Satanás se propõe a incitar os maus, ao passo que Deus, por sua providência, os quer dobrar ora para cá, ora para lá. Isso vemos claramente na ocasião em que um espírito maligno, enviado por Deus, invadiu Saul (ou o deixou). Não é lícito atribuir isso ao Espírito Santo. Portanto, vemos que o espírito imundo é chamado de espírito de Deus, sendo que ele responde ao beneplácito e ao poder de Deus; é instrumento da sua vontade, e não autor propriamente dito.

Há uma grande distância entre o que Deus faz, o que o diabo faz e o que os malfeitores fazem numa mesma obra. Deus faz servir à sua justiça os instrumentos maus que ele tem na sua mão, e que ele pode manobrar em prol de tudo quanto lhe pareça bom. O diabo e os ímpios, maus como são, produzem e criam, mediante suas obras, maldade concebida em seu espírito perverso.

O diabo reina num homem mau e, Deus age tanto num como no outro.

Sicut scriptum est...

Bibliografia utilizadas na construção deste artigo:
- As Institutas, volume 1 (João Calvino – Editora Cultura Cristã)
(Há, no artigo acima, várias compilações da obra acima, não havendo indicação por aspas ou referências, a todas elas. Minha intenção é incitar o leitor a pesquisar nessa obra e, assim lê-la.)

05 novembro 2011

CONFUNDIR O PECADO COM OS EFEITOS DO PECADO


















Por Greg Gilbert

Está ficando comum apresentar o evangelho por dizer que Jesus salva a humanidade de um senso inato de culpa, ou de falta de significado, ou de falta de propósito, ou de falta de sentido. É claro que essas coisas são realmente problemas, e muitas pessoas as sentem profundamente. Mas, a Bíblia ensina que o problema fundamental da humanidade – aquilo do que precisamos ser salvos – não é falta de significado, a desintegração de nossa vida ou mesmo um debilitante senso de culpa.

Essas coisas são apenas sintomas de um problema muito mais profundo: o nosso pecado. O que temos de entender é que a triste situação em que estamos é algo que nós mesmos produzimos. Nós temos desobedecido à Palavra de Deus. Nós temos ignorado os mandamentos de Deus. Nós temos pecado contra Ele.

Falar sobre ser salvos da falta de significado ou da falta de propósito sem reconhecer que essas coisas têm sua origem no pecado pode tornar o remédio mais fácil de ser tomado, mas é o remédio errado. Isso permite que o ouvinte continue pensando em si mesmo como uma vítima e nunca encare o fato de que é um criminoso, injusto e merecedor de condenação.

29 outubro 2011

A mui piedosa esquerda cristã? - Blog Casal 20 comemorando 1 ano de aniversário!


Queremos iniciar as comemorações do aniversário do nosso blog, publicando alguns artigos escritos por nós e que foram muito importantes na nossa formação, porque foram textos escritos na ebulição de ideias que nos apaixonam.

Para ter acesso ao texto de D. Robison, é só clicar sobre o título do texto dele abaixo. Dom Robinson Cavalcanti é bispo anglicano da Diocese do Recife e autor de, entre outros, Cristianismo e Política – teoria bíblica e prática histórica e A Igreja, o País e o Mundo – desafios a uma fé engajada. Abraços sempre afetuosos. Casal 20.

_____________________________________________________


"A mui piedosa esquerda cristã", de Dom Robinson Cavalcanti, publicada pela Revista Ultimato (maio - junho/2008) é um texto estranhíssimo já pelo seu título, que me sugerira, inicialmente, uma ironia à dita "esquerda" cristã. Todavia, relendo o texto diversas vezes, constatei que aquele título era aquilo que proclamava mesmo: louvar a esquerda como a própria encarnação do Bem.

A estranheza é exatamente por essa idéia arcaica e preconceituosa de trazer um velho maniqueísmo da luta (de classes?) entre o Bem e o Mal. Assim, aceitando-se que o título versa sobre a tão grande piedade da esquerda cristã, só pode-se concluir sobre a existência do outro lado da força, o lado negro, o lado impiedoso, mau, conformado, que seria uma provável direita cristã. Este maniqueísmo antes de ser arcaico é perigoso. Chocante mesmo é vê-lo estampado num título que recria o imaginário de que ser da esquerda cristã é piedoso e ser da direita cristã, segundo o texto de Dom Robinson, é o contrário. Talvez, por ter sido apenas uma reflexão, Dom Robinson passa por cima de questões importantes para a honestidade dos eventos ali narrados no texto dele.

O texto traz novamente aquela antiga referência ao texto de Atos, que cita a venda dos bens e a partilha dos mesmos na Igreja em Jerusalém, como sendo o ideal perdido da primeira experiência socialista da história. O que se quer que as pessoas creiam é que o Cristianismo, desde seu nascedouro é socialista, entretanto, aprendi que Atos é um livro de narrativa histórica e não de doutrina, por isso quaisquer eventos ali narrados precisam passar pelo crivo das cartas doutrinárias para que possam ser estabelecidos como modelos a serem repetidos na Igreja Cristã. Apenas como exemplo, se fossemos observar o livro de Atos doutrinariamente, teríamos que passar nossos enfermos pelas sombras dos nossos líderes atuais para que fossem curados ou, ainda, sermos adeptos do voto de nazireu, ao qual se submeteu Paulo, após sua conversão, ao menos duas vezes durante o livro. Doutrinariamente, a ordem às igrejas é diversa daquilo que aconteceu em Jerusalém (ver II Ts 3:12 e 13). Mas, além dessa questão doutrinária, também há os fatos históricos que indicam que a experiência que houve na Igreja de Jerusalém não foi repetida pelas demais igrejas e, por isto mesmo, quando a grande fome atingiu o mundo daquela época, as demais igrejas é que precisaram ajudar a Igreja de Jerusalém, que, portanto, fracassara na sua prática "socialista". 

É muito forte o poder da cultura ao nosso redor e que insiste em nos moldar pensamentos, filosofias, sentimentos e práticas, ao ponto de proclamarmos com a boca uma fé, mas agirmos na contramão de nossas palavras. Estou falando da insistente interpretação que muitos fazem do texto de Mateus, capítulo 25, especificadamente o texto sobre o Juízo Final. É um texto tão mal digerido por algumas correntes evangélicas, que, antes de abordá-lo, Dom Robinson reafirma sua pública profissão de fé de que as obras não salvam, para, logo depois, entrar em contradição dizendo que "o critério de julgamento será pelas evidências éticas sociais". Quais? Robison diz "tive sede", "tive fome". A caridade, a obra social, segundo Robinson, será o "critério de julgamento". Pura contradição! Esta exegese romana, mas acompanhada por muitos setores evangélicos, não se sustenta se compreendermos o livro de Mateus como um todo e a seção apocalíptica em que se encontra a narrativa de Jesus em Mateus. O texto é claro (não para a mui piedosa esquerda cristã de Dom Robinson), os pequeninos irmãos do texto são os discípulos de Jesus e não o pobre e necessitado. Jesus está falando que as nações serão julgadas de acordo com a posição que tomarem diante da pregação e testemunho da Igreja Perseguida (esta é que está presa, com sede, com fome e nua). Se há duvida, compare os seguintes textos de Mateus 10.42; 12.48-49; 18.14 e, ainda, veja como Jesus se identifica com sua Igreja diante de Paulo no caminho para Damasco: perseguir a Igreja é perseguir o Cristo. Mas, como disse acima, a cultura do meio em que estamos é poderosa para moldar a nossa interpretação, mesmo que esta seja contraditória com a fé que confessamos. A cultura na qual estamos inseridos é romana e, não à toa, há poucos anos atrás esse mesmo texto de Mateus foi lema da Campanha da Fraternidade, que visava justiça social.

O texto de Dom Robison desenvolve uma lógica de atirar pedra no próprio telhado (ou melhor, no telhado do que o autor identifica como sendo a impiedosa direita cristã). Começando pela Igreja de Jerusalém e os Pais da Igreja, em seguida ele desenvolve a idéia que a Reforma Protestante foi responsável indireta pelo capitalismo e seus excessos, que foram criticados pelo movimento dos Niveladores, socialista e comunistas, etc. Dom Robinson conclui o parágrafo citando a ladainha desses movimentos que entenderam que a propriedade privada era um mal em si mesmo. Assim, Lutero e Calvino participaram da construção desse mal, para Dom Robison. Se não foi esta a idéia, então o parágrafo está mal escrito. Contudo, o sistema do pensamento está ali: a igreja começou bem em Jerusalém e depois com os Pais da Igreja, até que vieram Lutero e Calvino que possibilitaram com suas doutrinas o avanço do capitalismo sobre o sistema feudal (mesmo que de maneira indireta e irrefletida), mas que houve movimentos que criticaram esse mesmo capitalismo e o direito à propriedade privada apoiados pela Reforma Protestante. Ora, deveria ser evidente para os cristãos que os Pais da Igreja defenderam a justiça social, não porque havia um "pensamento de esquerda" (como afirma Dom Robison), mas simplesmente porque pregavam o Evangelho do Reino de Deus. O que Dom Robison também não diz é que ao lado das ações veterotestamentárias de justiça social (Ano Sabático, Ano do Jubileu, etc), há também a defesa da propriedade particular (ver capítulo 22 de Êxodo). Se a propriedade privada fosse um mal em si mesmo, não haveria a proibição no Decálogo de se cobiçar a casa e as demais propriedades do outro.

Há no texto de Dom Robinson uma confusão do significado das palavras socialismo e esquerda. Esquerda seria um termo que surgiria no período pós-revolução francesa, mesmo que com um sentido totalmente diverso do que se entende hoje. Mas, durante todo texto, Dom Robinson remonta a presença do pensamento de esquerda desde muito antes desse mesmo surgimento. Contradição? Piora quando ele insiste em intercambiar os termos socialismo e esquerda. E piora ainda mais quando ele alega que essa esquerda cristã está presente tanto no catolicismo quanto no meio evangélico de séculos atrás, colocando num mesmo parágrafo o padre Lammenais, a Rerum Novarum e os socialistas cristãos como se todos esses fossem representantes legítimos dessa esquerda cristã da qual ele trata. Ora, o Padre Lammenais teve suas teses atacadas duas vezes pelo Papa Gregório XVI, que as chamou de heréticas. A Rerum Novarum NÃO é uma mudança de direção nos rumos da Igreja Católica Romana como a construção do parágrafo dá a entender. A Rerum Novarum é uma carta encíclica do papa Leão XIII de 15 de maio de 1891 exatamente para condenar, veja bem, condenar as propostas socialistas que contaminavam as relações entre patrão e empregado e, ainda, traz num dos seus parágrafos a defesa do direito à propriedade privada. Enfim, não dá para colocar a Rerum Novarum no texto de Dom Robinson que louva exatamente aquilo que a carta papal atacara. 

Outras contradições do texto de Dom Robison surgem ao citar a frase de Laski, pois se Laski está certo, o texto de Dom Robinson perde completamente a razão de ter sido escrito, porque, até hoje, as experiências socialistas sempre foram antidemocráticas (ver Stalin, Fidel, Coréia do Norte e China, que juntos mataram mais de 150 milhões de pessoas que não concordavam com seus socialismos).

Difícil aceitar que a esquerda cristã seja formada pelos inconformados com as desigualdades não-naturais, conforme está citado no texto de Dom Robinson. Não posso me conformar com isto! Mais uma vez um maniqueísmo anticristão, que julga as pessoas pelos grupos que participam e não pelos argumentos racionais que elas defendem. Ora, dizer que a esquerda são os inconformados e a direita os conformados é preconceito no melhor sentido da palavra. Porque não posso me conformar com a aliança de uma mui piedosa esquerda cristã com o materialismo e o ateísmo em nome da justiça social e do bem comum. Ainda nesse contexto, qual é a solidariedade que a esquerda ofereceu em Cuba, na antiga União Soviética, na China, na Coréia do Norte? Estas esquerdas foram apoiadas por cristãos piedosos, que sacrificaram a Verdade em troca da Paz. Paz? Nem isso a esquerda imaginada por Dom Robison pode nos oferecer. 

O texto termina falando que a esquerda cristã é essa gente "piedosa e ortodoxa", uma miríade de novos nascidos. Mas não posso me conformar com isto também! Não vejo piedade nem ortodoxia, quando as pessoas são rotuladas e julgadas por não fazerem parte do mui piedoso grupo da esquerda cristã e seu pensamento único. Não vejo piedade nem ortodoxia em pensadores como Leonardo Boff e Rubem Alves que não acreditam na Ressurreição literal de Jesus Cristo e nem no seu sacrifício vicário e, ainda assim, se intitulam esquerda cristã; não vejo piedade e ortodoxia num governo brasileiro que teve o apoio da esquerda cristã para chegar ao poder e hoje luta para aprovar leis contra a família e o Evangelho. Não há piedade e ortodoxia numa esquerda cristã que apoiou um governo que agora quer amordaçar a boca de seus pregadores, enquanto essa mesma esquerda cristã não se empenha para denunciá-lo da mesma forma como outrora se empenhou com tanta veemência para colocá-lo no poder. 

Gostaria de encerrar esta reflexão retornando ao título deste meu texto. Adjetivos são palavras que modificam o substantivo, mas que também o diminuem. Uma casa pode ser maravilhosa, bela e sonhada da maneira que pudermos em nossa imaginação. Mas a casa amarela pode ser a mesma casa, mas já diminuída de todas as suas possibilidades. Já não pode ser tudo o que poderia para todos, porque o adjetivo limita. É hora de retirarmos quaisquer cascas de sobre o evangelho, pois seu primeiro anúncio se deu logo após a Queda narrada no terceiro capítulo de Gênesis, muito antes de quaisquer querelas de direita e esquerda. Criar adjetivos como "social", "integral", "holístico" só enfraquecem a novidade das boas novas. Pois o evangelho é supra-ideológico, a igreja é que muitas vezes se faz "intra" e "sub" ideológica (e tem pagado um alto preço por isso em todos esses séculos). É preciso que retiremos os adjetivos e retornemos com os genitivos dos textos do grego: o Evangelho do Reino de Deus. Este evangelho que poderá transformar a sociedade em todas as suas instâncias (política, econômica, social, moral, espiritual), não porque seja de direita ou de esquerda, mas porque está sobre e fora destas bandeirolas e, exatamente por isto, como faziam os profetas de antigamente, um Evangelho que está livre para proclamar o bem onde quer que este esteja e denunciar o mal de onde quer que ele venha.

Casal 20