Por Igor Miguel [1]
Liturgia é uma palavra de origem grega que significa "serviço". Cristãos evangélicos temem esta palavra, principalmente aqueles oriundos de comunidades pentecostais e neo-pentecostais, por causa de alguma influência do "protestantismo radical" e dos avivamentos que receberam grande influência de correntes pietistas. Por isso, círculos renovados (carismáticos/pentecostais) preferem um culto espontâneo, com orações livres, sem expressões simbólicas de culto, por causa de uma radicalização da reforma protestante a seu passado católico romano, que se valia de expressões litúrgicas como meios de obtenção de graça e alguns problemas que foram criticados com razão pela reforma protestante.
Não obstante, a crítica reformada não era à liturgia em si, mas ao uso abusivo de "formas litúrgicas" que substituíam em muitos casos a consciência cristã e uma espiritualidade sóbria pela performance mecânica de determinados rituais.
Sempre tive apreço por algumas expressões clássicas de espiritualidade, sempre gostei de me integrar à textos bíblicos e recitá-los como se fossem orações de minha autoria para Deus. E o mais importante, expressões litúrgicas como: orações coletivas, leitura pública das Escrituras, a ceia do Senhor e outros elementos, expressavam umaespiritualidade comunitária, ao invés de um pietismo que explora e concentra a vida do espírito na experiência individual, algo recorrente em nossos dias, principalmente nos círculos cristãos já mencionados.
Por isso, estou a procura de expressões clássicas de espiritualidade, principalmente aquelas que me integram ao Corpo de Cristo e me fazem sentir parte de uma grande comunidade, a Igreja. Hoje, procuro trazer um tempero litúrgico para minhas orações devocionais, principalmente de manhã, e confesso, tem sido muito bom.
Tenho seguido o livro de orações diárias da Igreja da Inglaterra (Common Worship Prayer Book), que é um livro das comunidades protestantes daquele pais. Obviamente, o material não está em português, quem sabe um dia poderemos traduzi-lo. Esse livro de orações encontra-se disponível gratuitamente na Internet. Nele é possível encontrar uma sequência litúrgica em que orações se intercalam com textos bíblicos e orações de personagens cristãos importantes da antiguidade e da modernidade (Agostinho, Calvino, John Wesley, João da Cruz, Tertuliano e outros), além de motivos especiais de oração para cada dia semana.
De qualquer forma, para aqueles que não leem inglês e se interessam por este formato milenar de espiritualidade, abaixo lhes dou uma sugestão liturgicamente estruturada de devocional:
1) Oração do Senhor (O Pai Nosso)
2) Orar um Salmo de Louvor (Sl 113-118), ou
2.1) Orar um texto bíblico ou outros salmos.
3) Meditar na Lei do Senhor
Ler e meditar
(estas são algumas sugestões de textos que podem ser intercalados durante a semana):
- Os 10 mandamentos.
- Trechos do Sl 119
- Trechos do Sermão da Montanha (Mt cap.5-7).
- Deuteronômio 6:4 e seg. (conhecido conhecido entre os judeus por Shemá)
--> Sobre o uso protestante do Credo Apostólico veja aqui e aqui.
Creio em Deus Pai, todo-poderoso, |
Criador do céu e da terra. |
E em Jesus Cristo, |
seu único Filho |
nosso Senhor. |
Que foi concebido pelo poder do Espírito Santo, |
nasceu da Virgem Maria, |
padeceu sob Pôncio Pilatos, |
foi crucificado, morto e sepultado, |
desceu à mansão dos mortos, |
ressuscitou ao terceiro dia, |
subiu aos Céus |
está sentado à direita de Deus Pai Todo-Poderoso, |
donde há de vir julgar os vivos e mortos. |
Creio no Espírito Santo, |
na Santa Igreja Universal, |
na comunhão dos santos, |
na remissão dos pecados, |
na ressurreição da carne, |
na vida eterna. |
5) Oração espontânea.
- Motivos de intercessão:
- Pela Igreja perseguida;
- Pelos poderes políticos;
- Pelos santos e a Igreja no mundo;
- Pela expansão missionária;
- Pela salvação dos eleitos do Senhor;
- Pelas necessidades da comunidade local;
- E outros motivos.
Tenho observado, que uma estrutura litúrgica no devocional nos disciplina e cria "ilhas de eternidade"*, de reflexão e contrição em um mundo frenético, que igualmente é palco de nosso engajamento vocacional. Além disso, orações estruturadas desta forma, evitam orações egoístas, privadas e orações que por sua excessiva espontaneidade acabam se tornando vazias de conteúdo e direção. Após este ritmo devocional, mesmo as orações feitas de forma livre, tornam-se mais alinhadas com uma espiritualidade comunitária e menos individualizada.
Para uma reflexão sobre a liturgia vale a pena uma lida no meu texto: Amor, Corpo e Liturgia.
Vamos orar?
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*Para uma compreensão da ideia de "ilhas de eternidade" e espiritualidade no tempo, vale a pena ler o livro "O Schabbat" de Abraham Joschua Heschel. Uma reflexão filosófica e teológica de um filósofo judeu a respeito dos intercursos da eternidade na história e rotina.
Nota:[1] Texto originariamente postado em Pensar...
Um comentário:
Caro irmão, eu mesmo conheci algumas dessas publicações, comprava-as sempre para minha mãe e minha esposa as aprecia relendo alguns exemplares ue ainda temos. Pessoalmente não gosto das publicações mais novas que tomaram e tomam outro caminho ( pessoas querem compor, criar, suas próprias devocionais e soam um pouco artificiis pela linguagem, inspiração, ou se são sinceras ).
A que me refiro é internacional, em várias línguas incluindo o português do Brasil. Pequena prática para ser caegada de um lugar apra outro, lida em todos os momentos e com devocionai apra um trimestre cada. Trata-se de "No Cenáculo". Um abraço.
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