"A Verdade não precisa de defesa; por si mesma ela se defende. A Verdade precisa ser proclamada!"

29 dezembro 2009

"O Cavaleiro Das Trevas"






















Por Jorge Fernandes Isah


1) Assisti ao filme “O Cavaleiro das Trevas” com o meu filho, dias atrás. A direção é do Chris Nolan, um diretor de qualidade, responsável por bons produtos como “Amnésia” e “Insônia”. A partir de “Begins”, ele assumiu a direção da grife criada pelo lendário Bob Kane nos anos 30. Batman é um personagem interessante, conflituoso, e que ainda mantém certa moralidade mesmo nos tempos pós-modernos e relativistas de hoje (o que prova que o homem comum tem no seu íntimo a Lei Moral de Deus).
O filme é permeado por disputas morais e éticas, onde o bem e o mal se digladiam numa luta sem fim. Não vou entrar nos méritos da produção, direção e interpretação. Há pessoas mais qualificadas para isso. Ater-me-ei ao fato que julgo principal no filme, e que Nolan destaca: a fé no homem.
Desde o início existe uma confrontação entre a justiça e a injustiça, entre polícia e bandidos (alguns infiltrados no governo), entre moral e imoral (ainda que os limites da moral estiquem-se para além da moralidade), entre ético e antiético, entre bem e mal. Esse dualismo, se não me engano, remete a Descartes e Locke, mas talvez a algo mais distante: os gnósticos, Aristóteles e Sócrates. O mundo da ficção é assim mesmo, e o dos quadrinhos nem se fala, mas no mundo criado por Deus não há dualismo. O mal não é uma força antagônica a Deus, antes sujeita-se, servindo-O como tudo o mais no universo. 

2) Para a indústria do cinema Deus é um espectador. Durante as duas horas e meia do filme Ele está ausente, excluído do mundo, ainda que do mundo fictício. Sobra espaço para a sorte, o acaso, o destino e outros tons místico/fatalistas (o promotor Dent lançando o “cara ou coroa” antes de executar as suas vítimas é um exemplo). No mundo de Gothan onde sobra maldade, delitos e desordem, o homem rejeita Deus, mantendo-se mais e mais distante enquanto afunda-se na destruição. Para o homem pós-moderno o pecado individual não existe, há somente o pecado institucional e coletivo; e a sociedade desesperadamente busca um salvador, mas nem Estado nem cidadãos estão aptos. Um super-herói talvez. Mas será ele capaz? 

3) Ainda que Gothan City esteja dominada pelo submundo do crime: Máfia, corrupção policial, tumulto social, etc, o inspetor Gordon, o promotor Dent, e o Homem-Morcego, representam o lado “benigno” da raça humana. Eles são os guardiões, os paladinos, nos quais a cidade deposita a sua esperança. Há um tom otimista em meio ao pessimismo, de que no limiar da crueldade os homens poderão redescobrir a bondade esquecida, e buscar em si mesmos o fio de esperança que tornará o mundo um lugar justo e melhor para se viver. Mas o próprio filme encarrega-se de destruir esse paradigma. 

4) Batman é o herói anti-herói: incompreendido, rejeitado, acusado (inicialmente as pessoas se fantasiam de Homem-Morcego, e se sentem estimuladas a combater o crime)... e, por fim, culpado. Ele vê todo o seu esforço em manter a paz e a ordem em Gothan culminar num encadeamento de tragédias onde todos os planos redundam, um a um, em estrondosos fracassos (mesmo quando aparentam vitórias). Neste ponto, Batman, Dent, Gordon e Gothan têm o mesmo sentimento: vulnerabilidade; e estão à mercê da insanidade catastrófica do Coringa. O mal toma as suas feições, e parece invencível. Batman e Dent são alçados aos postos de heróis, de salvadores, mas a impressão é de que o mal triunfará; personificado no caos fomentado pelo Coringa, o qual, implacável, derrota cada investida do trio do bem (não há aqui a alusão à Trindade Santa como nos filmes “O Senhor dos Anéis” e “Matrix”). 

5) Na seqüência em que o Coringa coloca bombas em dois barcos, um abarrotado de cidadãos fugindo do caos e outro com os prisioneiros mafiosos transportados para fora da cidade; ambos são alvos da ira do vilão. Dois detonadores são colocados nos barcos, e cada um deles tem o poder de destruir o outro barco. O Coringa coloca em xeque a moral ou a amoralidade da população. Trava-se uma luta pela ética: até que ponto tem-se o direito à vida alheia? Deve-se apertar o botão e destruir centenas de vidas a fim de se salvar? Há uma tensão moral, uma disputa na mente das pessoas entre o certo e o errado, e em alguns momentos a indecisão ou covardia parece ser o ponto determinante.
Fico a imaginar se esta cena fosse real. Não haveria uma disputa para se apertar o botão primeiro e mandar aos ares o barco “inimigo”?
O desfecho da cena sugere que a salvação do homem encontra-se no coletivo, na consciência social, e de que ela será capaz e suficiente para resgatá-lo do mal. 


6) De certa forma, Batman assemelha-se a Cristo, ainda que seja uma semelhança estética, fragilmente delineada. O filme parece mesmo uma alegoria à Bíblia. Batman é o homem encarregado de redimir o povo de Gothan, assim como Cristo redimiu os Seus eleitos. Batman, ao assumir os crimes cometidos por Dent, torna-se criminoso, sem, contudo, ser condenado. Cristo, ao assumir os pecados dos escolhidos, tornou-se criminoso, pagando o preço com a própria vida, derramando o Seu sangue na cruz do Calvário. Batman era incompreendido pelos cidadãos de Gothan. Apenas Alfred, Lucius, Gordon e o filho, sabiam de sua inocência. Cristo foi rejeitado até por Seus discípulos. Batman foi perseguido. Cristo também, culminando em sua morte expiatória. Batman foi odiado. Cristo, idem. 

7) Batman jamais salvará Gothan (ele tem de conviver com os seus pecados, erros, e consciência aflita), por mais altruísta que seja, o super-herói não está disposto a morrer por Gothan, e ela sabe disso: nunca estará livre do mal, do Coringa e do caos, mesmo que Batman se decidisse pelo sacrifício. Cristo não tem pecados, e entregou-se voluntariamente pelos Seus como o único meio pelo qual o homem é salvo. Batman não tem controle sobre si mesmo. Ele simplesmente reage aos fatos. Cristo tem completo controle sobre Si (Jo 10.17); sobre todas as coisas (Jo 1.3), inclusive o pecado, a morte e o mal (Hb 4.15; Rm 6.9; 2Co 5.10).
 
8) O Cavaleiro das Trevas é uma ficção, como o homem que deseja salvar a si mesmo também vive uma ficção. E olhará para si, e se verá condenado. Assim como Bruce Wayne está confinado ao estigma do morcego, o homem está preso às correntes do pecado, e por si só é impossível livrar-se. 

9) Ao contrário, Cristo é o poder real, o único e suficiente salvador do homem: “E em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos” (At 4.12). A realidade irrefutável de que Deus não é um mero espectador e não pode ser alijado do universo (a despeito da vontade e dos esforços sobre-humanos), é que Ele opera a redenção na vida dos eleitos pelo Seu Filho Amado. 

10) Cristo é a luz verdadeira, que ilumina a todo o homem, mas o mundo não o conheceu. E como Batman, o homem cavalga nas trevas, rumo à condenação.

Fonte: Kálamos

Nenhum comentário: